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Mensagens

O festim

Horas perturbadoras,dias inquietantes,lapsos temporais, estonteantes vazios de frustração e pena. Terra de ninguém, travessia infértil de ideias. Fraqueza redundante. No esgotamento e desistência brota uma palavra do nada,  outra que vinda se junta ao festim. No fogacho, fogo fátuo,  irrompe uma ideia, depois a frase que a exprime. Apareceram quando se ansiava tanto, bem vindas sejam! Na abstração do pensamento gera-se um novo ser, abrindo caminho numa folha de papel. Orgia de arromba!  Irrompem sem tocar a campainha, trazem as figuras de estilo e mais amigos, enchem de iguarias o salão Vai ser até as tantas, grande e magnífica ressaca esta! Das palavras que se desembrulham em papelotes coloridos.

Um jantar à luz das velas

Jantar num monte alentejano decorado com memorabilia e pormenores de gosto desconcertante – posto que da aristocracia não se pode alegar mau gosto nem adjectivação inapropriada - antigo coto de caça de uma família com pergaminhos,   do norte, que agora aluga o espaço em package com direito a histórias de passados gloriosos em voucher de fim de semana. Manuseando talheres antigos e outros que para lá caminham, veio a tema, entre um lombo de porco e uma “ crumble ” de maçã, a excelência da empregada ucraniana.   Não fora o facto merecedor da mais sonora admiração, o de ela falar bom português com acento alentejano, ainda conseguiu o feito de levar os dois filhos ao colo até a licenciatura num estrangeiro que não este. A “ Mãe ” – não a da ucraniana mas a da anfitriã - acometeu-se de uma arrelia crónica que a levou à morte,   por ter de partilhar a mesa de família com autóctones de Massamá e outras proveniências. Foi uma enxaqueca que a consumiu, a da partilha e por

A raposa e o mineiro

A escuridão é quase absoluta num túnel feito pela mão do homem, escavado nas entranhas da terra, terra adentro, na direção das profundezas. Não se veria praticamente nada não fosse um coto alimentado por uma lamparina de azeite presa no capacete, a debitar uma luz mortiça. Uma multidão de homens escuros, sem rosto, sem um som de voz a sobressair no ruído insustentável das picaretas, formigas que escavam e transportam incessantemente toneladas de carvão: o ouro que alimenta as feéricas e estonteantes máquinas que rolam sobre carris, e que vão ligar de ponta a ponta o mais grandioso Império do Mundo, de Ocidente a Oriente, de S.Petersburgo a Vladivostoque. Esta gente alimenta eternamente os seus czares, e dobra as costas massacradas em tormentos, no bater das botas de todos os cossacos. Vlad, nunca vê a luz do dia, consome-se nas trevas de uma gruta, mineiro à força, escravo do Grande Senhor da Rússia. Cá fora – não há cá fora nessa terra maior do mundo - todos são igualme

Não foi assim há tanto tempo

As crianças passavam os dias na rua até que o chamamento estridente das criadas para o jantar, se desenvencilhasse do bruá dos putos no pátio, e fosse ouvido, com pena da brincadeira terminar. Guelas, caricas com a cara de jogadores famosos, pião, bola claro! Apanhada, cabra cega... as peças do puzzle do dia a encadear os sonhos da noite. Tempos de mudança. Os rapazes tinham mais liberdades que as raparigas, mas algumas   começavam já a desnovelar uma   vida confinada aos quartos e salas bafientas por onde acirandavam as mães e outras antiguidades. Tempos de convívios incómodos, para elas que se aventuravam nos primeiros deslumbramentos fora do universo bafiento,   para eles cedência de espaço, galarós tímidos presumidos de à vontade. Os géneros acabaram por se fundir no grande pote da infância e quase todos recordam com nostalgia o tempo em que o tempo parou. O espaço do pátio que então parecia enorme e hoje não tem pretensões de grandeza, partilhava-se assim